A Procuradoria-Geral de Justiça de Roraima e o Gaeco (Grupo de Atuação Especial de Combate ao Crime Organizado) denunciaram o presidente da Assembleia do Estado, Jalser Renier (Solidariedade), e outros 16 investigados por peculato, pertinência à organização criminosa e lavagem de dinheiro. A acusação formal do Ministério Público de Roraima alcança agentes públicos, políticos e empresários investigados por desvio de dinheiro da Assembleia, no âmbito das operações Cartas Marcadas e Royal Flush, deflagradas pelo Gaeco, em junho de 2016 e janeiro de 2019.
A denúncia foi protocolada na Justiça em 18 de julho. As informações foram publicadas pelo Ministério Público do Estado nesta quinta-feira, 25.
De acordo com a acusação, após a Cartas Marcadas, os investigadores identificaram a participação de Jalser Renier no esquema. O Ministério Público afirma que, ‘na condição de presidente da Assembleia Legislativa do Estado de Roraima, a partir de janeiro de 2015, estruturou e aperfeiçoou o esquema criminoso de desvio de recursos públicos do parlamento estadual, realizado por meio de processos licitatórios simulados’.
Entenda as fraudes
O Ministério Público do Estado informou que analisou 36 procedimentos licitatórios apreendidos durante a Operação Cartas Marcadas. Os investigadores apontaram desvios de dinheiro público que, somados, chegaram a R$ 23.679.166,74, entre 2013 e 2016.
A denúncia destaca que o esquema era dividido em quatro núcleos, ‘cada um com papel diferenciado’. Segundo a investigação, a Cartas Marcadas já havia identificado três núcleos criminosos: Agentes Públicos, Empresarial e Operadores Financeiros e Laranjas.
“Com o aprofundamento da apuração criminal, chegou-se ao quarto e mais relevante Núcleo Criminoso, o Núcleo Político”, informou o Ministério Público em nota.
A Procuradoria e o Gaeco informaram que, a partir de 2015, o esquema passou a ‘a agir de forma ordenada’.
A acusação aponta que Jalser Renier era ‘ordenador de despesas e chefe da organização criminosa, principal beneficiário dos recursos desviados, junto com sua esposa Cinthya Lara Padilha’. O deputado estadual Marcelo Cabral foi denunciado por peculato e é investigado por organização criminosa.
A acusação atribui a Rosinaldo Adolfo Bezerra da Silva, o Naldo da Loteria, 1º Secretário da Mesa Diretora da Assembleia, à época, a corresponsabilidade ‘pelos sistemáticos pagamentos fraudulentos’.
De acordo com a denúncia, o núcleo de agentes públicos era ‘formado por cinco agentes públicos, todos, direta ou indiretamente, vinculados à Comissão Permanente de Licitação da ALE/RR, responsáveis pela linha de montagem e ‘atestos’ dos processos licitatórios ‘maquiados”.
O núcleo empresarial, afirma o Ministério Público, era composto por ‘pessoas responsáveis diretamente pela manutenção de empresas de fachada’. Elas atuariam para ‘maquiar a realização de procedimentos licitatórios, simulando falso ambiente competitivo e permitindo o direcionamento de recursos públicos à organização criminosa’.
A acusação registra que o ‘núcleo de operadores financeiros e/ou laranjas’ eram ‘eram responsáveis pelo processo de reciclagem e ocultação dos ativos financeiros obtidos de maneira ilícita’.
“Todos com forte ligação familiar ou profissional com o líder da organização criminosa, Jalser Renier. Nesse núcleo destaca-se a atuação de Carlos Olímpio de Melo da Silva, pois detém em seu nome impressionante patrimônio pessoal, chegando a mais de 300 imóveis”, apontou o Ministério Público.
“As investigações apontam que Olímpio tinha atuação destacada dentro da organização, pois coordenava a lavagem de dinheiro desviado pelo bando de forma sofisticada e também detinha em próprio nome bens que pertencem, na verdade, ao líder da organização criminosa, Jalser Renier. Carlos Olímpio é funcionário da Assembleia Legislativa, lotado no gabinete do presidente da ALE/RR.”
A liderança do esquema
O Ministério Público de Roraima aponta ‘diversos elementos de prova que demonstram o envolvimento e liderança de Jalser Renier na organização criminosa’.
“O fato de emitir sucessivas ordens de pagamento em processos licitatórios flagrantemente ilegais e assinar cheques de até R$ 600 mil em contratos desprovidos de qualquer contraprestação de serviços, já deixa certo o seu envolvimento direto na organização criminosa”, destaca a Procuradoria.
“Não bastasse isso, ainda foi encontrada anotação na agenda de Verona Sampaio Rocha, ex-presidente da Comissão Permanente de Licitação da ALE/RR e pessoa de estreita confiança do deputado Jalser Renier, de um repasse em espécie em seu favor no valor de R$ 728 mil, no dia 28 de abril de 2016.”
A Procuradoria apontou ainda. “Ao constatar a imensa desproporcionalidade entre a renda do presidente da Assembleia Legislativa de Roraima e o seu patrimônio pessoal, não resta dúvida sobre a atuação dele no esquema criminoso. A maior parte do patrimônio de Jalser Renier se encontra em nome de ‘laranjas'”, afirmou o Ministério Público.
A investigação identificou ‘339 imóveis em nome de Carlos Olímpio Melo da Silva, operador financeiro de Jalser, e 29 imóveis em nome de Cynthia Lara Gadelha Padilha’.
“O casal ostenta uma vida luxuosa. Além de viverem em uma mansão avaliada em mais de R$ 8 milhões, com quase 1000 m² de área construída, Jalser e Cinthya adquiriram carros de luxo, joias, óculos de sol e bolsas de marca avaliados em mais de R$ 1 milhão”, afirmou a Procuradoria.
“Os automóveis apreendidos na residência de Jalser Renier e Cinthya Gadelha foram avaliados em R$ 870.558,00. Destaca-se que nenhum dos veículos está em nome de Jalser ou Cinthya.”
A acusação aponta que ’22 bolsas de luxo de Cinthya Gadelha foram avaliadas em R$ 180 mil’.
“Chama a atenção, a bolsa Chanel Beige Clair – Made in Italy, feita com couro de bezerro, cujo valor alcança R$ 24,4 mil. Os 55 óculos de sol do casal foram avaliados em R$ 96.691,00. Destacam-se os óculos da marca Dita, modelo DRX 2030, avaliados em R$ 5,8 mil”, detalha a denúncia.
‘Gravidade’
O Ministério Público afirma na denúncia que os crimes investigados na Cartas Marcadas e na Royal Flush são de ‘gravidade e extensão ímpares, o que impossibilita a reunião de todos os crimes e seus respectivos autores em uma mesma ação pena’l.
“Por essa razão, seguindo a linha já adotada pelos Tribunais Superiores em casos similares, a presente denúncia se limita aos desvios de recursos públicos praticados por intermédio da empresa Construtech Construtora e Empreendimentos Ltda, nos anos de 2015 e 2016”, relata a Procuradoria.
“Os demais fatos, relacionados a outras empresas e em outras legislaturas, serão objeto de futura denúncia.”
São alvo desta acusação ‘atos praticados pela organização criminosa no bojo dos Processos Licitatórios 011/ALERR/2015; 062/ALERR/2015, 094/ALERR/2015 e 021/ALERR/2016’. O prejuízo aos cofres públicos, segundo a Procuradoria, alcançou R$ 2.398.945,00.
A denúncia aponta que em um dos processos licitatórios fraudados, Jalser Renier emitiu e pagou em cheques o valor total de R$ 1.188.250,00. O Ministério Público relata que o serviço não foi prestado e que não identificou orçamento detalhado em planilhas, pesquisa de mercado e descrição das etapas dos serviços a serem executados.
De acordo com a Procuradoria, houve intermediação de mão de obra para executar atribuições próprias da estrutura administrativa de programas da Assembleia Legislativa (Chame e Escolegis).
“Naldo da Loteria, concordou, autorizou e emitiu com o presidente da ALE/RR, Jalser Renier, os 12 cheques fraudulentos em favor da empresa Construtech Construtora e Empreendimentos LTDA., mesmo tendo a inegável ciência de todas as irregularidades que permearam o Processo Licitatório n.º 011/ALE/2015”, registra a denúncia.
“Corrobora nesse sentido, o fato de a empresa não possuir empregados no período de 2013 a 2016, conforme consulta ao sistema CAGED – Cadastro Geral de Empregados e Desempregados – do Ministério do Trabalho.”
Segundo a Procuradoria, no mesmo período, somente em contratos com a ALE/RR, a Construtech foi beneficiária de contratações da ordem de, pelo menos, R$ 6.848.095,05. A denúncia destaca que empregados informais da Construtech fizeram obras para Jalser Renier, ‘tanto em sua residência quanto na construção do Auto Posto Princesa Isabel’.
De acordo com a denúncia da Procuradoria, a empresa foi usada para o ‘branqueamento’ do capital desviado, especialmente por meio de transações bancárias e saques em espécie.
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